domingo, 16 de setembro de 2012

O Refém - Um Homem Bom

De repente, depois de anos de cruel exercício olhando sempre para fora, surpreendeu-se mais centrado nele mesmo do que no resto do universo. Nada como um susto para dar um novo norte à sua existência. Uma espada da Dámocles pairando sobre a cabeça, a percepção da finitude e de fragilidade que leva a um misto de penoso desalento e revolta. Acho honestamente que lhe proporcionou um crescimento mais produtivo que alguns anos de terapia. A vida é esse corredor polonês. O que conta no final não são as bordoadas que levamos no caminho, mas os passos que conseguimos dar adiante.

Embora preso a uma rotina de vida em que era comum sacrificar seus interesses em prol de outrem, agonizava dentro dele o refém que embalara por quase meio século. Já verbalizava a palavra “não” com uma estranha satisfação de vitória. Estava gostando! A compreensão de que o amor incondicional é na verdade um suicídio espiritual o colocou no caminho da troca desse prazer, cujo feedback positivo o alimentava com a  vida - literalmente com vida.

Não tinha mais vários problemas, mas apenas percalços. Como não existe essa história de virar a página e fazer uma nova vida, ainda trazia no lombo a carga do passado. O que acontece hoje é o somatório do que fizemos até então. Imaginou pretérito o tempo de questionamentos. O que faria de agora em diante é que iria ditar seu futuro e ainda que não pudesse apagar a escrita de sua vida, nesse momento acreditou que morria o refém.

Durante algum tempo seu sorriso era farto, sua respiração fácil, seu passo firme e a visão clara. Abriu mão de todo tipo de razões para abraçar apenas a razão da lógica. Não contava porém que para seus pares sua alforria era inadmissível. Como poderia não estar disponível 30 horas por dia?

Esse conflito fez seus neurônios baterem pino, as juntas pareceram se desarticular e o coração sambar fora de compasso. Teve a paz por curto tempo e levou consigo o refém que nunca conseguiu exorcizar.

Não presto aqui as últimas homenagens, pelo contrário, lhe renderei tributo por todos os dias do resto de minha vida. Como causa mortis diria apenas: um homem bom.

Nesse novo ano judaico que se inicia, deixo cantada uma mensagem gravada pelo coral Kol Haneshama, onde se diz:

Que seja da tua vontade Nosso Deus
E Deus de nossos ancestrais
Que se renove para nós
Um ano bom e doce

Clique aqui para assisti-la.