O que os deuses mais gostam é ver os
homens fazendo planos. Reza o folclore mitológico que muitas das vezes que
ouvimos trovões, na verdade são eles rindo de nós.
Não compro muito essa história de
povo escolhido. Diferentemente disso acho que foi esse povo que escolheu ser o
escolhido. Não posso crer em um deus que demonstre sua preferência por um dos
filhos, que faça um time perder para o meu ganhar e que sendo de tal forma
faccioso, possa ser eleito como parâmetro de justiça. Em momentos de destempero
destrói cidades com tudo que nela existe ou inunda o mundo. Se fomos criados à
sua semelhança, até que já o entendo melhor, porque por vezes os filhos nos
tiram do sério.
O que Tique, a face grega de Fortuna,
deusa romana da sorte mais detesta é encontrar alguém dormindo. Vira as costas
vai embora e não volta nunca mais. Ela tem horror a preguiça e a indolência.
Imaginem então essa figura em uma repartição pública brasileira!
É vero que embora estivesse quase nas
mãos de Morpheu, vivia ávido e atento, sedento por uma oportunidade e jamais
deixaria escapar uma como a que Tique colocou em minhas mãos.
Não escolhi Lia. Quando encontrei
minha Valquiria fui tomado por tamanha e arrebatadora paixão que não nos sobrou
opção. Aceitamos então termos sido escolhidos um para o outro, desdenhamos os
sorrisos sarcásticos dos céus e fizemos mesura para Tique.
Nunca foi uma guerra fácil, um
passeio no parque, tivemos que fazer desde sempre o melhor possível e estarmos
sempre alerta. Já disse antes que o torno mecânico que Deus usou na confecção
de Lia é de ouro e platina, foi usado apenas uma vez e está exposto em um
pedestal lá no céu.
Esteve sempre à frente do tempo,
criando, organizando tudo e me empurrando para cima. Agora que todo circo foi
montado, que o paciente parece querer sair da UTI, Lia precisa de mim assim
como eu dependo dela.
Isso toma do começo ao fim do meu dia
e “muita mais faria se não fosse para tão grande amor tão curto o dia” (Daprés
Camões - modificado).
Frequentemente surpreendo-me
cantarolando as canções que me acostumei a entoar como hinos. Entre meus
desejos está a superação dessa batalha insana pela vida e a volta ao meu lugar
no coral.
Escrevo à minha família Kol
Haneschamá para ratificar que tenho vocês como meus irmãos e que no tempo em
que estivermos rindo por último e ofertando presentes à Tique estarei também
cantando com a família outra vez.
Um baita shaná tová para todos porquê
nós merecemos, lutamos por isso e no fim vamos rir por último vendo nosso time
ganhar.