domingo, 22 de julho de 2012

Não tirem o sofá da sala



Para não quebrar a rotina, assistiam ao jornal da TV no já velho sofá da sala. Ficavam fisicamente próximos e naquele começo de noite pouco ou quase nada se falavam.  O que a princípio podia parecer distância, era em verdade uma intimidade e aproximação que dispensava as palavras. Mesmo no silêncio ele sabia quando ela tinha sede e não passava despercebido nela que havia preocupação no coração dele. Era mais que comum um pensar em alguma coisa e o outro verbalizar. O que havia sido criado naquela relação era tão forte e profundo que por vezes suas almas mal se distinguiam, embora nunca tenham perdido sua individualidade o que mais intensa tornava sua ligação.

Foi um daqueles momentos em que nos perdemos em uma elação interminável de ideias quando um pensamento puxa outro, outro e outro e acabamos dez anos luz do início. Assim a imagem da moça do tempo lhe lembrou da previsão de chuva antes da viagem para Paris ano passado, na véspera da final de Roland Garros que o reporta a desistência de Nadal, que não vai jogar por problemas no joelho, assim como a empregada que não foi trabalhar porque o filho foi operado e tem a louça esperando na pia, que vai cair no seu colo porque ela também está em fase de recuperação de cirurgia e precisa ser cuidada como uma rainha porque ele a ama e ... se percebeu acariciando sua mão sendo correspondido com uma dança de dedos entrelaçados ainda em silêncio, como faziam desde sempre.

Ela se chega um pouco mais permitindo mais carícias enquanto deita a cabeça em seu ombro. Seus corações se aceleram e viajam no tempo de volta aos primeiros encontros, o que os torna um pouco mais jovens sem perder a experiência dos anos. Juntos já haviam navegado muito e de repente se viram explorando outra vez os mais recônditos igarapés um do outro e o sofá da sala foi palco da mais linda e pura expressão de amor explícito.

Ainda colados, a respiração ofegante recuperando-se dos excessos, permaneceram assim por alguns minutos quando ela não aguenta e lembra que precisavam de umas mudanças na casa. Ele também não resiste e consente: - faça o que achar necessário, só não tire o sofá da sala.

Ela se aconchega um pouquinho mais em uma anuência silenciosa e com um doce sorriso em seus rostos adormecem agarrados.

3 comentários:

  1. que lindo, como é bom estar em paz e poder curtir essa coisas, um abraço. Claudia

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  2. Que admiravel sequencia de acontecimentos !!! Gostei muito, Arnaldo !!!
    Um abraco, Lea.

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  3. Muito lega! Gostei muito da idéia do sofá como catalisador do estreitamento deste relacionamento, onde cada um contextualiza as informações ali recebidas/vividas em uma gama de pensamentos distintos que, ao final, os remetem à aproximação pela memória afetivo-amorosa, crescendo mais ainda em amor e afeto, graças ao velho sofá!! Parabéns pela sacada!

    Abraços! Gustavo Salgado

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