domingo, 10 de junho de 2012

Sobe e Desce

Iankel era um predestinado. Nascera em uma família tradicional com tudo muito em seu devido lugar, no tempo certo e da forma correta. Da escola trazia sempre boas notas, era querido pelos coleguinhas e o preferido das professoras. Na faculdade era cercado de amigos. Para descrevê-lo de forma sucinta diria que era um líder entre os homens e o tipo querido das mulheres.

Seus pais e os pais destes eram pessoas destacadas na comunidade, não faltavam ao culto do Shabat e além de cumprir com o que acreditavam ser sua obrigação sob a ótica de suas convicções religiosas, contribuíam generosamente para causas sociais.

Cresceu nesse clima de retidão e dogmas, ambientado nas histórias da bíblia e exemplos da Torah, por onde viajava sua imaginação e delírios em mil e uma noites. Era assíduo nas organizações juvenis onde se tornou um expoente. Não foi surpresa, portanto quando anunciou seu desejo de se tornar um rabino, pelo contrário, era uma expectativa da família e foi comemorada como uma vitória de eleição presidencial.

A vaidade é talvez o mais terrível dos pecados capitais. Junte-se a isso a presunção e o resultado é o desaparecimento súbito do chão sob seus pés. Lembro-me de um campeonato de lutas marciais mistas, ainda nos primórdios dessa modalidade, onde o grande campeão e disparado favorito, entrou no ringue contra um ilustre desconhecido. De guarda baixa e nariz empinado acreditava piamente que a sua figura seria o suficiente para espantar a valentia de qualquer um. Foi atingido já nos primeiros segundos por uma martelada no queixo e só soube do ocorrido muitas horas depois, já no leito do hospital, devidamente atendido e medicado.

Outra forma de garantir a derrota é subestimar o inimigo. A história nos presenteia com inúmeros exemplos. Geralmente as vítimas esquecem de pequenos detalhes, justo do tipo que por milênios vem moldando a história da humanidade. Se isso, se aquilo!

E lá ia a vida dando linha a Iankel, quando chega a hora de assumir a liderança em uma sinagoga. No primeiro dia subiu ao púlpito tal qual o campeão, muito confiante, nariz para cima, sem qualquer sinal de humildade que a generosidade da vida se furtou em plantar naquele fértil terreno.

A preleção foi pontuada por uma inesperada gagueira, se perdeu entre o início o fim e o meio, sua lógica foi míope e o que era para ser um triunfo mostrou-se o caos.

Desceu abatido e cabisbaixo, uma figura distante daquela que se via habitualmente e foi direto buscar explicação na sabedoria do velho rabino cuja experiência de vida estava disfarçada sob sua longa barba, marcada em sua pele e em sua coluna curvada.

Dos labirintos das mais diferentes culturas, mosaica, hindu, muçulmana e demais, o velho trouxe à tona com uma espantosa simplicidade um misto de cristalina sabedoria e profícua experiência:

- Se você tivesse subido como desceu, teria descido como subiu.

Enquanto isso nos céus...bem isso é uma outra história.


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