quinta-feira, 2 de fevereiro de 2012

De mecânico, de médico e de louco...

Um dileto amigo médico lembrou outro dia, palavras sérias e compenetradas da esposa de um paciente a seu marido, que após ter se auto medicado, não se sentia nada bem – “... a automedicação leva à morte!”

Passado o tempo e ainda que possa parecer jocosa, essa alegação reveste-se de seriedade quando nos deparamos com uma assustadora estatística de pessoas que não satisfeitas em se “consultar” com o balconista da farmácia, que nem técnico é, ouvem amigos, estranhos, pesquisam na internet, se prendem a mensagens alarmistas divulgadas na rede e muitas vezes seguem um instinto baseado em histórias que ouviam de seus avôs.

Ainda garoto, após assistir a um mecânico consertar meu carro e claro, com a arrogância e a petulância da juventude, aventurei-me a fazer o mesmo. Era uma época em que se regulava um motor como se afina um violão. Era preciso ter ouvido, escutar o motor, sentir sua “respiração”, conhecer o equipamento e basicamente saber o que está fazendo. Para resumir, não seria surpresa o final dessa história acabar na oficina.

Constantemente sou questionado por pacientes e amigos sobre uma matéria publicada em uma imprensa dita de credibilidade ou pescadas nas ondas etéreas da internet.

Em um desses artigos, um curioso dissecava as nefastas conseqüências da biópsia de próstata guiada pela ultra-sonografia. Como uma metralhadora giratória lançava ameaças de todos os tipos cujas causas teriam origem em um procedimento rotineiramente realizado a nível ambulatorial pelo mundo afora, já por dezenas de anos. Eu mesmo tenho uma casuística de biópsias de mama, próstata e tireóide que ultrapassa a casa de vários milhares, com mortalidade zero e morbidade medida em fração de uma unidade.

Por mais que eu tentasse fazer alguma associação da biópsia da próstata com insuficiência cardíaca congestiva (belo nome), não achava o caminho e me perdia nas tramas do interlocutor, tão alucinantes que eram. Tentei extrapolar para o câncer de mama que deve obedecer aos mesmos critérios médicos de decisão, mas em vão.

Há que se ter uma postura equilibrada, bom senso, conhecimento de causa para não tomar decisões de ouvido, não afinar todos pacientes sob um mesmo diapasão, não decidir por um procedimento com um horizonte pontual e também não perder o “timing”, por que fatalmente acabaremos com nossos pacientes na oficina do corpo.

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