sábado, 26 de novembro de 2011

Hamurabi, o Zé e a Rocinha (Resposta Editorial Globo)

Quem conta um conto aumenta um ponto, diz o dito popular, imagine então uma coleção de informações, passadas de boca a boca por centenas de anos, o quanto de pontos não teria acumulado.

Embora não possa ser lida como fonte fidedigna de informações, a bíblia traz o enredo do que pode ter sido uma parte da história, servindo mais pelos seus simbolismos. Até mesmo sua ética, em vários episódios, deve ser questionada pelo ângulo da modernidade.

Por trazer um pensamento de milhares de anos, presa a conceitos arcaicos, peca por vezes em seu conteúdo moral, como quando Lot ofereceu à choldra que batia a sua porta, sua mulher e filha desde de que não tocassem em seus amigos, representados nessas mil e uma noites, como anjos com procuração do divino. Uma atitude abominável e impensável nos dias de hoje sob a ótica de qualquer povo.

Por volta desse tempo, cerca de 1700 AC, viveu um imperador amorita que uniu as diversas cidades estado, respeitou as religiões das cidades conquistadas e desenvolveu a agricultura, mas o feito tido como o mais significativo foi a edição de um código de leis, baseadas nos princípios sumérios da Lei de Talião, em verdade jurisprudências, conhecido como Código de Hamurabi. Haviam agora regras baseadas nas experiências do cotidiano, que deveriam ser seguidas. Quem não o fizesse pagaria fisicamente caro por seu erro. Simples assim.

De volta a atualidade e frente a questão das favelas, uso com frequência um chavão cruel: Você pode tirar o indivíduo da favela mas difícil é tirar a favela desse indivíduo.

Em um país que tem como máxima a Lei de Gerson, que os atos de corrupção estão incrustados na alma da administração do estado e que se mede em bilhões de reais, que tem sua terceira densidade populacional sobre palafitas, onde a tuberculose é endêmica apenas a poucas dezenas de metros de condomínios de classe média-alta, onde a incidência de relações incestuosas assusta até mesmo os mais vividos, onde o caos administrativo é a expressão da cirrose social em que vivemos e onde o IDH ombreia países africanos, a chance de uma ação policial, por mais bem sucedida que tenha sido, ter um final feliz é muito pequena se a continuidade não for uma mudança radical no pensamento desse povo.

Há que se implantar um sistema educacional rigoroso de baixo para cima e uma repressão desproporcional de cima para baixo. Lugar de criança é na escola e de bandido na cadeia. Trata-se de toda uma cultura que deve perecer para dar lugar a um comportamento individual ancorado na ética, para então esse sentimento de retidão contaminar toda nação.

Já tive a oportunidade de caminhar pela Rocinha e ver pessoalmente o desprezo da maioria pela higiene e bons costumes. Essa promiscuidade associada ao padrão cultural e pela densidade desumana é um caldo de cultura para o crime, que já assistimos renascer em outras favelas, como no Complexo do Alemão.

A dor é ver a decepção daquele jovem que há quase 40 anos estava convicto de que o povo unido não seria vencido. O foi pelo conjunto de qualificação negativas inerentes ao ser humano.

Pode parecer irônico ouvir isso da boca de um ateu, mas o homem é uma experiência divina que não deu certo (outra vez o simbolismo).

Gosto desse tal de José Beltrame, mas no episódio do Alan Turnowsky, que foi inocentado e teve seu processo arquivado, sua atuação foi no mínimo dúbia.

Ou está certo do desvio do delegado e encobriu informações ou está convicto de sua retidão e por questões que não me atrevo a tentar entender, não se postou ao lado de seu par.

Esse país ainda tem uma grande caminhada pela frente. Voltando aos exemplos bíblicos, esse povo precisa passar seus 40 anos no deserto (simbolismos) e como um condor, renascer de suas próprias cinzas.

Em tempo, gostei muito de seu artigo.

Atenciosamente,

Arnaldo Welikson - médico

welikson.blogspot.com

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